sábado, 31 de dezembro de 2016

Ciclos

Fecham-se,
abrem-se
ciclos,
portais
do irremediável
e do desconhecido.

Nutre-se,o vivo,
dos resquícios do tempo.

Desveste-se,o agora,
vestindo nova roupagem.

Abrem-se,
fecham-se
ciclos,
portais
do inconciliável
e da ancestralidade.



(foto: Google)

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Receptáculo

Por onde as coisas passam
não se guarda nome,
mas elas alimentam
um estranho lume,
ficando despojadas
de que as consome,
retornam, vertidas,
em quem as perturba,
sem desconfiança
que seu experimento
é linha que traça,
anterior-posterior,o ponto,
que se faz península,istmo
e deixa rastro e ritmo.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Ode ao Inverno

Bendito sejas,inverno,
que nos deste a nudez,
o pálido, o ímpio,o avaro,
outro corpo de sensatez.

Bendito sejas,inverno,
desmistificando o furto,
reinaugura modos
de descascar o fruto.

Bendito inverno sejas,
inundando-nos de hálito,
orvalho de um pomar
podado de todo hábito.

(imagem: Google)


quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Resenha




O escritor Herman Schmitz comenta o meu livro INTERSECÇÕES:

Li este livro em apenas uma tarde, mesmo tentando me controlar para ler bem devagar, foi impossível. Depois disso ainda continuo folheando aqui e ali, pois sempre há algo para captar-se.
O livro é um devir que compactua com o tempo e a vida. É como um sopro da própria vida que se sente respirar de dentro do livro. Cleber Pacheco consegue de forma magistral um equilíbrio de linguagem entre a poética de imagens sutis e elegantes, e do outro lado, a prosa que narra o cotidiano simples e despojado de um casal, que em alguns parágrafos chegam a inquietar com as sugestões implícitas nas palavras efetivamente impressas.
Um dos temas do livro é o desejo. Os personagens fazem muitas listas, que são desejos sob pontos de vista diferentes. Ambos veem as necessidades de manutenção da casa e da vida, de compras de objetos de uso pessoal, de afazeres em geral, de um modo quase antagônico:
"Poderia comprar um cão para deitar-se ao meu lado enquanto leio o jornal. 
Poderia comprar um gato para deitar-se em meu colo enquanto olho as revistas.
Poderia fazer mais ginástica e corrida para fortalecer os músculos.
Poderia fazer mais passeios para tomar chá com as amigas."
Portanto, o mais impactante no livro está no alcance "para além" dessas descrições breves, pois a maneira como o autor as vai interpolando, adquire um texto de fundo com um sentido maior ao livro, na verdade é mais que um sentido lógico, é um sentimento, uma espécie de paz que só nos ocorre em contato com as obras de arte mais genuínas.


terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Caverna

        I
Figuras silenciam
o que palavras
contemplam.
Rancor e boca
escondem
o que o olhar
geme.
Sombras
projetam
rostos na caverna.
O insuficiente
extrai
sobras
do infinito.

      II

Sombras projetam
olhos
na caverna.
O vento abre
eco indefinido.
Reconhece,
o poço,enfim,
o seu domínio.
Avante,
no céu,
garças delatoras.

(imagem) Google)


segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Troca

Reparto a pedra,
espalho o pó,
semeador de sede
ao redor do caminho.
Há os que recolhem
e os que destecem,
escavando leitos
de rios nas areias.
Goles ocorrem
em cerradas bocas,
nó de saliva
no seio do seco.
De cascalho,fertilidade
cravando no solo
raízes de rocha,
avesso de flor,escoadouro de sol.
Furto o aquoso,
resgato o úmido,
catador de conchas
nas dobras do mar.

(foto: google imagens)

sábado, 24 de dezembro de 2016

Natal

Nasce menino
desafiando o sublime
em Luz e Graça,
menino poeta
tecendo parábolas
na surdez do mundo,
menino encantado
na aridez dos desencantos.
Nasce,menino,nasce
desfiando o tecido
da treva,trazendo
contigo a túnica
do Inefável.

(foto: presépio brasileiro do século XVIII- Google imagens)

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Resenha


  O escritor e ator W. J. Solha faz uma resenha do meu livro INTERSECÇÕES. 

O INTERSECÇÕES, de Cleber Pacheco - TAL COMO O BRASIL – NÃO É PRA PRINCIPIANTES. Há muito eu não via uma inovação literária tão radical quanto a desse romance – editora Penalux, 2016. Estamos longe da novidade da narrativa fracionada em verbetes, como no Dicionário Kazar, de MiloradPavitch, que é de 84; da história que admite várias ordens de capítulos na leitura, como no Jogo da Amarelinha, do Cortázar, de 63; do romance com cada capítulo em seu próprio estilo , como no mais distante ainda Ulisses, de Joyce – de 22; e longe até mesmo do realismo mágico de Cem Anos de Solidão, García Márquez – de 67. Acho que a última obra nessa linha, no Brasil, foi o Avalovara, de Osman Lins, de 73, com sua estrutura baseada no quadrado SATOR. Ou: Não: meu romance Israel Rêmora, de 75 - Prêmio Fernando Chinaglia de 74, é algo como esse Intersecções antes da desintegração nuclear promovida por Cleber Pacheco: os capítulos - intermediados, sempre, por poemas que são monólogos do protagonista - não têm nada a ver uns com os outros, a não ser pelo personagem que têm em comum.
Bem, o fato é que eu dava o experimentalismo , por esse enorme hiato até o Intersecções, como findo. Morto e enterrado.
Mas o que vem a ser a sua inovação? Eu falei em desintegração nuclear. Mas é melhor pensar nos 930 fragmentos de manuscritos hebraicos, aramaicos, e gregos encontrados em Qumran, datados de 250 a.C., conhecidos como do Mar Morto. Fragmentos, eu disse. O texto de Intersecções é cheio de lacunas. A impressão é a de que Cleber Pacheco, depois de produzir seu romance, que me lembra o Cântico dos Cânticos – em que um versículo é sobre a amada, no caso Margarida ( ligada às flores), o outro, do amado ( Pedro, ligado às pedras, como no evangélico “Pedro tu és pedra” ) - saiu deletando as vinculações mais óbvias entre os trechos.
Mas a quarta capa entrega o que vem, afinal, a ser o livro: “A trajetória de um casal, da infância à velhice”.
Infância.
Isso explica o primeiro período, que tem qualquer coisa de esforço de memória. Sabemos, ao reler o romance, que é Pedro quem conta:
“Está escuro. Há uma bruma que aos poucos vai se dissolvendo. (...) E ela está aqui, ela veio. De onde surgiu? Não sei. Apenas constato a sua presença.”
Pausa. E é a vez de Margarida:
“Isto é o alvorecer. Há uma flor e uma rocha. Ambas em silêncio. Após a escuridão, surge um vulto logo à frente: é ele.”
Esse alvorecer passa a ser simbólico, tal como a flor e a rocha, que são os dois - Margarida e Pedro.
Aí a velhice é explícita:
“O velho guardou sua dentadura”.
“A velha guardou seus óculos”.
Na primeira página do livro há quatro citações, todas enfatizando a importância das fábulas. A última, de Chesterton, é genial:
- Contos de fadas são a pura verdade: não porque nos contam que os dragões existem, mas porque nos contam que eles podem ser vencidos,.
Bem a propósito. Em todo o livro há marcas – suponho que da infância do autor - tanto desses contos, como da Bíblia e de outras fontes místicas, como a mencionada Tabula Smeragdina de Hermes Trismegisto.
Isto está na página 63, com qualquer coisa do "Qualquer coisa" de Caetano, em que "pra lá de Marrakesh " leva a canção a dizer "que mexe qualquer coisa dentro, mexe / Já qualquer coisa, doida, dentro mexe/ sem essa aranha, sem essa aranha, sem essa aranha! Nem a sanha arranha o carro / Nem o sarro arranha a Espanha"
Pedro:
“Estou tentando encontrar a dracma perdida. As dez virgens esqueceram de colocar azeite nas lamparinas. Era estéril a figueira e foi amaldiçoada”.
Na página seguinte, Pedro de novo:
“ Joguei pérolas aos porcos”.
Confesso que não sei se ele simplesmente disse a frase metafórica do evangelho de Mateus, ou - sutilmente - nos remeteu à palavra "pérolas" em latim: Nolitemittere MARGARITAS ante porcos.
E Margarida:
“Mordi a maçã envenenada”.
E ele:
“Eu sou o filho pródigo?”
Ela:
“Espetei a ponta do dedo na roca.”
É a bela... adormecida.
Como no Ying e Yang, os dois se completam.
E, como no lance de Chesterton, no qual os dragões não existem, mas as fábulas mostram que podem ser vencidos, na página 76 há uma menção a “João e Maria”, com a metáfora da morte dando à luz uma providência real:
- Perdi, no caminho, os pedaços de pão. Vieram os pássaros e os comeram. Acabarei na casa das bruxas. Vou doar minhas córneas.
E o duplo fracasso em que redundou suas vidas, vem assim:
“Não encontrei o pote de ouro no final do arco-íris”.
“O que faço, Conto até dez? Conto carneiros?”
“Aguardo a foice.”
Apesar disso, o título da parte que se abre na página 83, já no final, é “Rosa e Diamante” – o que mostra que ao fim e ao cabo, os dois progrediram.
OK. O final. O que não é dito, o tempo todo, acaba dando à prosa um tom de poema longo. Sugiro à editora Penalux( que editou meu último livro, DeuS e outros quarenta PrOblEMAS ) mudar a divulgação da nova obra, fazer como nos trailers de Hitchcock: “Não contem o final a ninguém!” ( como contei aqui ). “Não leia as resenhas, fique longe dos que dissecaram o livro!”
Mas eu o dissequei? Longe disso.
Página 89: o autor nos diz como tentou reproduzir a vida:
“Prossegue o rascunho dos dias”.
Página 43:
“Ele agora pensa ´Tudo o que eu digo é prefácio ou posfácio. Não sei onde ficará a obra”.
Mas vamos encerrando. Veja isto ( páginas 81 e 82 ): É um poema, cada frase dita depois de enorme pausa:
“ Não há abracadabra. // Não há palavras cabalísticas neste instante. // Preciso trocar a senha. // Preciso ser alfabetizada. // Vou aprender arte rupestre. // Vou inventar a escrita cuneiforme. // Quem sabe eu receba a tábua dos dez mandamentos.// Quem sabe eu encontre a pedra de Roseta”.







quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Poemas curtos


ENTARDECER

A tia solteirona
encontra a mariposa
dentro de sua bolsa.

CONSOLO

Leite com biscoitos
oferece a mãe,
esquecendo que está morta.

REALIDADE

Árvore de Natal
não é árvore,
nem nó de pinho
é pinho.

Gravetos carregados por formigas
não são mero tronco,tora ou lenha.

SABEDORIA

Sobre o mar,
gaivotas
à espreita
de peixes.

INSTANTE

O inseto
no âmbar.


quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Verbo 2

   Cantar é desconcerto
que o roto alinhava,
fio do longe e do perto
que a agulha escava.

O desalinho é nota
fiada em via contrária,
inconsútil retalho e rota
de monotonia mui vária.

É,o som,desvario,
nó que destranca o fio,
fio que inventa a aranha,
eco e desafio
que o silêncio barganha.

( foto: Google imagens)

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Escritos Insanos 2


a pilha de lenha
não olha a não-árvore e o fogo
se olhasse não-árvore e fogo
pilha de lenha ser não podia
se não fosse não se veria
pilha de lenha
sim tronco e brasa
seiva e cinza
pilha de lenha
nunca é agora

(foto: Google imagens) 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Escritos Insanos

da romã as sementes
buscam refúgio
refugiadas as sementes
romã não querem ser
não-sendo são
menos que sementes
mais que sementes
essência de romã

(foto: Google)

domingo, 18 de dezembro de 2016

Viver

O miolo do limbo aquece
e fermenta estranho pão
cujo sabor esquece
receita e intenção,
num desnutrir tão vivo
que intensamente alimenta
o morrer mais esquivo
da memória que o sustenta,
o corpo só dando guarida
às veias de boca e mão,
mão que engravida
 a linha que alinha o chão,
fenda gritando "Ativo
apenas aquilo que ausenta
e,florescendo,avivo
saciedade que se desinventa".

(foto: Google imagens)

sábado, 17 de dezembro de 2016

Silêncios


Silêncio branco,
sem neve;
silêncio-árvore,
seco e oco;
silêncio-ovo,
sem galo;
silêncio -chama:
re-vela.

(foto: Cleber Pacheco)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

TRADUÇÃO



O PLURAL DOS NOMES

(Um poema de Raymond Radiguet- tradução: Cleber Pacheco).

Há caixas de joias cuja tampa é como um espelho.
O rio sobre o qual Narciso patina aprisiona
suas palavras. Larive e Fleury: Narciso se transforma
em flor assim que quisermos colocar seu nome no plural.

(foto: Google imagens)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Autor Convidado

Cláudio B. Carlos é poeta e prosador,nascido em 22 de janeiro de 1971,em São Sepé-RS. Tem vários livros publicados. Escreve no blog Balaio de letras.Criou o grupo de escritores O Bodoque. Ele  também é revisor,faz capas de livros e tem o blog Miradas  com suas fotografias.


OLHOS DE CORTAR CEBOLA

Tenho restos de carne,já apodrecida,sob as unhas: ossos do ofício. Já auxiliei muita gente a fazer a passagem.Coisa mais natural do mundo. Não é que eu não tenha sentimento,não é isso, é que tenho uma manha: nunca deixo o encomendado perceber meus olhos de cortar cebola...


O RATO

Há meses vinha sentindo  o seu cheiro azedo nas paredes de tábua e nos móveis, há meses vinha escutando o barulho das suas patas  no sótão e no assoalho e o derrubar de coisas,que guloso e daninho, provocava no meio da noite. Eu o odiava há meses.E agora está aqui espetado no garfo. Escorregou do caibro e caiu sobre a mesa e jaz aqui, de olhos esbugalhados,causando-me alegria, prazer e nojo.espirrando de sangue a mesa e estragando-me o jantar.




Algumas fotos do blog Miradas:





Algumas das capas criadas pelo autor:



quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

ELO

Cumprir o trato
de si e consigo,
filtrar o nato
de ti e contigo.

Romper o selo,
cravar a porta,
negá-lo e sê-lo:
morte e aorta.

Verter o avesso,
compor destreza,
reter o espesso
da incerteza.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Via Crucis

Cruzar é preciso
a estreita via,
criar o acaso
e silêncio que soa.

Espreitar o estreito,
oposto do dia,
reter o rastro
do que não voa.

Verter o vil
da estreita via,
urna de sal
que o sol coa.

(imagem: Google)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Verbo

Na boca brota
amarga erva,
fecunda horta
de transtorno e treva.
Saliva - a semente-
E voz - raiz -
despertam o dormente
que cala e diz.
Vinga o sustento
de toda pronúncia
reter o alento
de ar e astúcia.
Erva e amargo
o ruminar não encerra,
é de tal travo
que se ara a terra.

(imagem: Google)



domingo, 11 de dezembro de 2016

Anacoreta ( 2)



   Sob uma árvore,no aberto tronco,instalou-se,plácido.Amalgamado  ao vegetal.Não um parasita,em mimetismo.Um vago ruído de folhas e de seiva.As pessoas que até ali vão  tentam chamar-lhe a atenção, irritá-lo,fazem poses ridículas, gestos obscenos,cospem-lhe,atiram pedras,xingam,chamam-no de idiota,louco,estúpido.Diante de tal espetáculo, limita-se a ficar de quatro e pastar.


sábado, 10 de dezembro de 2016

Autor Convidado

   Hélvio Lima nasceu em Uberlândia,Minas Gerais,em 1947.Autodidata,expõe desde 1968. É formado em Letras Neolatinas pela Universidade federal de Uberlândia.
  Ele escreve poesia.  O artista vem trabalhando várias técnicas ao longo da sua carreira:pastel guache, óleo,desenho,gravura. Sua obra tem colecionadores do Brasil e no exterior.A estilização da figura humana ,os aspectos paisagísticos do cotidiano se constituem,desde sempre, em objetos temáticos da sua expressão artística.

                                             (Caminho-Serigrafia)

 

Sumo

listras azuis triscle e triluna
pentagrama no quarto aparente
ligeira voadora forma
legível pela janela
sentimentos raros

quisera o mundo acabasse agora
longe
entre listras azuis
cinco direções da estrela
trsicle e triluna
coração vagabundo
infinito aroma
                                                           (Ofício- serigrafia)


Vacilo

vacilo ante as pedras do caminho
às vezes me perco entre as que posso
e as que não devo retirar
mando embora ilusões à toa
blindo o coração do que me falta
respiro tênue madrugada
inspiro poesia no ar
e isto me abasteça
abjetas são todas as palavras que não servem para nada
vala comum das inexpressões elas se vão
umbrais do esquecimento estranhas armaduras
de quem caminhou noite inteira
por terra estranha
e não conseguiu chegar...

                                                      (Gente- serigrafia)


Uma parte acorda em mim

uma parte acorda em mim
levanta,escova os dentes,come na hora certa
a outra parte,discorda completamente
voa muito mais que anda
guerrilha,se arrebenta
depois fuma o cachimbo da paz
e nem assim se contenta...
                                         
                                                          (Praça- acrílico sobre madeira)



sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

A Arte dos Upanishades

Onde estou
não há estar
nem mesmo medida,
só o modo de aumentar
minha própria despedida.

Onde estou
não corresponde
à espécie de outrora,
apenas não esconde
o mapa do agora.

Onde estou
não ofende
nascimento ou morte,
mas de fato compreende
tanto o sul quanto o norte.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Metáfora (2)

Uma pedra à pedra
se acrescenta
e quanto mais daquela
se coloca,
menos esta aumenta.
Mesmo assim
na pedra segunda
algo cresce:
o que na primeira
 nunca aparece.
E esta pedra,
agora renovada,
cria corpo
numa outra estrada.
Mesmo sendo menos
que a pedra primeira,
é a segunda pedra
ainda mais verdadeira.
Não que seja aquela
fria e falsa,
mas falta a ela
um compasso de valsa.
Dando à outra
aquilo que já tinha,
mais clara a torna,
mais nítida é a linha.
Se não se mostra
a ninguém mais
 a pobre pedra quieta,
torna-a falante
a pedra do poeta.

(foto: Cleber Pacheco)
.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Saber

Dos Mistérios
nasce
o fruto primevo das coisas
em  inquietude de urna
saciando sedes,reavivando fomes
em água e vinho que se oferta
aos que têm olhos de ver.

Do Conhecimento
nasce
a flor intrínseca das coisas
abismada em  carne de pétalas,
crescendo nas cisternas do Vivo,
no íntimo dos que fabricam vasos
e cálices de esforço e espera.

Flor e Fruto
em corpo e sopro
no coração dos desencontros.


(imagem: Google)

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Movimento

Se algo é quanto segrega,
mais intenso é o segredo
daquilo que tudo congrega
quanto maior o degredo.

Se recupera o vestígio,
embora muito adquira,
nunca elimina o litígio
existente em toda mira.

Se a si mesmo refuta
e a ninguém abriga,
repele sua conduta
vítima da própria intriga. 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Côncavo-Convexo

Requer o corpo
algum volume,
mesmo tosco
ou sem perfume,
Até no mínimo
há certo relevo,
que,sendo istmo,
torna-se trevo.
A cada face
que ele aponta
de novo nasce
uma outra conta.
Sempre que soma
ou então deve,
algo retoma
do que proscreve.
Um outro lado,
um novo espaço
está cunhado
em seu regaço.
Insistindo,
se tresdobra
e vai construindo
 sua obra.
O que era rente,
torna-se fundo,
restando a semente
de um novo mundo.

(Imagem: Google)

domingo, 4 de dezembro de 2016

Metáfora

A tarde opta
ao que está apta
e,com toda arte,
tudo reparte,
para ir sentindo
o que vai assentando,
e o que some
com toda fome,
e o que segura
ainda que sugira,
qual o tempero
do seu desespero,
ou a máscara
de sua víscera,
qual o idioma
do seu sintoma,
e o recurso
do seu reverso,
sem que baste
o mero desgaste
para infringir
o que irá constranger,
tão indiscreta
quanto o poeta.

sábado, 3 de dezembro de 2016

O Peregrino

(Pequenas histórias e insights).

   * Caminhando pela campina,o Peregrino encontrou uma gota de orvalho.Encheu o seu cantil.

   * Atravessando a jângal, o peregrino se deparou com um tigre.  Reinventaram a arte de brincar.

   * Aventurando-se pelas cruas areias do deserto,o Peregrino vislumbrou uma folha. Plantou oásis.

   * Vendo a parasita estrangulando a árvore,transmutou-a,o Peregrino,em orquídea.

   * Passando pelo Limbo, o Peregrino encontrou dementes. Acendeu-lhes uma lamparina e seguiu em frente.

  * Chegando ao alto da montanha, o Peregrino contemplou as nuvens.Nelas desenhou a paisagem.

   * Escavando o deserto, o Peregrino encontrou uma cidade soterrada. No centro da cidade havia um templo. Em seu interior, a lamparina, ainda acesa, revelou,meditando,um monge.

   (foto:  Google imagens)

 

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

AUTOR CONVIDADO


Cristina Siqueira é escritora, poetisa, jornalista,decoradora.É  autora do Projeto Livro de Rua que transforma vias públicas em vias de leitura. Promove oficinas de literatura.Obras editadas –Papel ,A carne da noz,Por trás dos muros,Livro Prisma,CD-Se houvesse amor a vida seria carícia ,CD Metalic Orquídeas

SE HOUVESSE AMOR A VIDA SERIA CARÍCIA

pela janela espero um anjo
Se tudo fosse mágico não haveria fim
O perfume bastaria como um voto de paz
sem pensar a felicidade estaria guardada
sempre à espera em um lugar belíssimo
que por tantas vezes eu vi
Se houvesse amor a vida seria carícia
A última palavra, o jardim de rosas
O meigo cão, a guarda que basta

Os robôs guerreiros na promessa de paz
trazem a guerra 
- onde estar a salvo?
E no entanto ,o que sucede na sala do castelo onde se decide o destino do rei?
Deflagrar o espetáculo
Todos atentos
é real a vida
Procuro as armas no fundo do coração 
onde as guardei um dia

Além do rumor do mundo feio e confuso
os rios são frescos ,pássaros cantam

Acender de velas para entender a importância da questão que não quero crer nesta
espécie truculenta
e animal que se faz de fúria

As conversas com os gerânios
O suspiro das bromélias
Rosas de todas as cores
Borboletas
um vento bom
Calor e conforto
Ternura
para o tempo triste
O mundo não é quadrado
Volto ao ponto de partida
caminhei

Caminhei

Ralentar

Falar com a alma 
é o princípio de tudo

(Performance poética de Cristina Siqueira do poema de sua autoria no CD). 





quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Tutankâmon


   Não demorou muito para que a distância então criada se tornasse evidente. O amigo morava agora na cidade grande;ele continuava provinciano.
   Maior tornou-se o afastamento quando o menino da cidade mostrou ao outro o tesouro da família: um quadro formado por borboletas mortas:beleza  para sempre mumificada.
   O outro,que já se sentia humilhado o suficiente, expressou indignação, dizendo que era,aquilo, inacreditável coisa, abjeta.
   Contando para a família o que a visita pensava a respeito daquela preciosidade, pais e irmãos deixaram claro que se tornara,sua vinda,indesejável em casa de pessoas tão refinadas.
   Retornando ao mundo provinciano de onde viera,ele, com um aperto no peito, descobriu que acabara de se despedir da infância.
 
(foto: Google imagens).