quinta-feira, 29 de outubro de 2020

AUTOR CONVIDADO

 


   JONAS PESSOA DO NASCIMENTO é cearense radicado em Brasília, poeta e professor pós-graduado em Língua Portuguesa. Foi um dos vencedores do Salão de dezembro de Poesia e vencedor do  I Prêmio Amazonas de Literatura com o livro Chão Partido. É autor de diversos livros publicados no site Clube de Autores. 


                                                       


 

 

I

Até me compreenderem

mais nada serei:

nem sombra,

nem lembrança,

assombração,

nada!

 

Minha face

não estará em espelho algum,

por ora me nutre o verbo,

depois nem advérbio serei,

oxalá uma interjeição

de espanto pelo tempo que passou. 





II

 

Em cada lua,

em cada sol,

um verso no poema que a vida

tece todos os dias.

 

O ipê da minha quadra,

em penitência,

cobriu-se roxo.

 

Além do ipê

muitos ecos

inaudíveis

a quem se farta das flores.



III

Fosse o vento poesia,

cessariam as penas

de minha solidão.

Se nossas mãos se tocassem,

o prêmio seria o júbilo.

 

Muito da nudez humana

são ódio e medo abraçados

dentro de nós.

 

No meio da noite,

Encharcaram um indigente

alegando lavar uma vergonha social.

 

Outro dia, acordei

no meio de uma

viagem quando me despertaram

para os afazeres da vida.

 

O chão está sujo,

falta cor -

agem

para ag

ir (a) onde

se diz:

so

corro 



 




segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Oferenda Lírica- Tagore


 Ficarei quieto, esperando, como a noite

Em sua vigília estrelada,
Com a cabeça pacientemente inclinada.

A manhã certamente virá,
A escuridão se dissipará, e a tua voz
Se derramará em torrentes douradas por todo o céu.

Então as tuas palavras voarão
Em canções de cada ninho dos meus pássaros,
E as tuas melodias brotarão
Em flores por todos os recantos da minha floresta.


(foto:Google imagens) 

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Lobato e Clarice


 Quando criança, o meu sonho era ter Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Demorei para obtê-lo. Parecia inalcançável, mas o encontrei na primeira Feira do Livro a que pude ir. Anos depois, li um texto de Clarice Lispector (Felicidade Clandestina) a respeito de sua experiência e reações ao ganhar o livro de presente. Fiquei pasmo ao descobrir que minha experiência e reações haviam sido exatamente as mesmas.

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Resenha


 

   O livro Maravalha de Cláudio B.Carlos é uma bela publicação da Editora Saraquá em conjunto com a Editora Coralina. As ilustrações são  de Thassiel Mello e o projeto gráfico, de Angel Cabeza  

   A história é definida pelo autor como uma novela grunge gaudéria, uma classificação, no mínimo, curiosa devido ao aparente  descompasso entre mundos tão distintos. No entanto, cai como uma luva,pois a narrativa, requintadamente minimalista, mostra um lado "sujo" ambientada  num bar situado em alguma cidade qualquer do Rio Grande do Sul. Os  personagens  nem um pouco "edificantes", por assim dizer, são pessoas comuns, medíocres, desbocadas, que estão o tempo todo indo ao banheiro, urinando, vomitando, e em situações escatológicas.  O cenário é, na verdade,um microcosmo de relações humanas revelando vidas vazias, sem sentido. Ninguém tem realmente nada para dizer, para acrescentar.  O texto evidencia o vazio da contemporaneidade, a falta de perspectivas, uma angústia corroendo as entranhas, um desespero talvez ignorado pelos próprios personagens, inconscientes de sua real  situação ou ao menos tentando ignorá-la, escapando provisoriamente dela.  

   Todavia, o autor vai além, lançando o seu olhar desiludido sobre o mundo com maestria.  Há uma situação tensa que vai se intensificando o tempo todo. Um ato  foi cometido. Será descoberto?  Haverá consequências? Nesta época doentia do século XXI, não há lugar para a culpa,como em Crime e Castigo de Dostoiévski.  A preocupação não é ter cometido o erro. O que preocupa realmente é se ele será descoberto. Não se pensa em reparação.Ao contrário, é preciso fugir  dela a qualquer custo. Não há senso de responsabilidade, de castigo. Ninguém assume nada. Ninguém está disposto a carregar o seu fardo , não há lugares para feitos "heroicos" , para romantismos. O escapismo, tornou-se um recurso recorrente em nossa época. Assim como o entretenimento tomou o lugar da cultura e o excesso de informações roubou o lugar do conhecimento.  

   Ninguém se deixe enganar pela aparente banalidade da narrativa. Estamos lidando com um escritor contundente e visceral, capaz de dizer muito com pouco, criando cenas e situações com  perspicácia. Há uma sutileza a exigir a atenção do leitor e vai conduzindo a ação, oculta sob detalhes sórdidos de vidinhas inglórias. 

   Maravalha  até pode ser lido rapidamente. Mas continuará perturbando  a mente do leitor muito tempo após ter sido encerrada a leitura.