sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Entes


 

Trecho do meu livro Entes publicado pela  Editora  Penalux em 2017).  


  " Rumor vai se diluindo.  Talvez minhocas tenham  cessado de fabricar seus túneis.  Ou demônios tenham silenciado em seus túmulos. 

   Suor escorre das têmporas, ardem carnes do peito, esgarçam-se fibras dos nervos. 

   Voltando para casa. 

   A porta da frente está aberta.  

   Casa horta pátio tudo imóvel.  Somente ciscos na garganta.  A conversão em pedra. Abandono.  Nem o irmão. Ninguém. 

   O que aconteceu? 

    Sol se põe, a lua, a noite povoada de crateras.  Quietude. "  (...) 



terça-feira, 23 de novembro de 2021

GEMA

 


Sol, pai 

de minério e sombra, 

brotar 

do estéril e do instante 

na geometria do Caos,  

embrião de treva e luz

no corpo do inconcluso.


cristalizar 

de imagem em relâmpago ,

esquartejar 

de consistência e cor 

nos ritmos do estático.  

Sopro de brisa  

na calmaria  do desacontecido. 


O que existe 

gesta o parir 

de  prematuro e insano.

Ancião é o Não-Tempo ,

avô de todas as coisas 

expiradas e por nascer, 

sementes 

da lavoura  fecunda 

do  incerto. 


Mais séria é a Morte 

a engendrar 

os arabescos do Espaço, 

arte de inventar 

pedras macerando nuvens  

nas saliências do ausente, 

círculo a converter-se em círculo 

nos estratagemas do silêncio,,

repouso  a rastejar  

as agruras do inquieto. 


Estilete  de gelo é o dia 

a liquefazer

a alvura do branco 

 a sedimentar o claro: 


nascer 

é tão improvável 

que nunca cessa.  

Respirar

o denso  é outro modo 

de liquidar o sólido. 


Deus 

é areia a escorrer 

nas fissuras do  límpido. 

É imprescindível 

criar 

o que já foi inventado.  




quarta-feira, 17 de novembro de 2021

POESIA


 Acender o Sol, 

moldar a Terra, 

inspirar a morte,

ressuscitar o tempo, 

recortar a sombra,

costurar o vento, 

insuflar  vida 

no que ela tem por dentro. 


Iluminar a Lua, 

clarear a luz, 

molhar a água, 

alagar o oceano, 

recolher a noite ,

estender o dia, 

saber que tempo 

é mais que cada ano. 


Escavar o Eterno, 

desdobrar o Infinito, 

remendar as horas 

em sua ossatura, 

modelar o instante  

em outra anatomia, 

tempo não é corpo, 

é só fratura: 

reatar o Todo , 

transfusão de sangue, 

Cosmos em curvatura. ,


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Entrevista

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Bharatanatyam


 Além do abismo,

o movimento,
o que conta e tece
revestindo de gesto
o anônimo.
Da velha Índia
a forma
que redefine o mundo
na gênese do Caos.
O corpo, a mudra
na aparição
do instante.

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Novela


 

"Deixo as folhas caírem,  o vento soprar,  o gelo vir.  Absurdamente permito acontecer.  Cada vez que uma folha cai,  o vento sopra  e  o gelo  vem.  Vanessa acontece.  É isso.  Outro segredo não posso revelar. 

   Recuso as missas de corpo presente,  os cantos fúnebres,  os epitáfios,  os belos discursos,  a leitura do inventário. 

   POuco me importa saber quantos  quilos de alimento  foram por ela consumidos., quanto pesava,  qual sua altura,  quais  suas cores preferidas,  quantas palavras pronunciou  durante toda a sua vida, que doença  a matou,  como vive uma pessoa que está morrendo.  

   Importa-me  u, jeito único de sentar-se que tinha , um relance de olhos,  uma expressão  de rosto,  o modo de caminhar,  o retiro e silêncio." 

( Livro publicado em  2005).