Alexandria
Quem irá mensurar
todos os vocábulos pronunciados
de Adão ao Fim dos Tempos?
Nossas células transpiram
palavras
no dicionário dos poros.
Nossa pele é vestimenta
a encobrir a nudez de Eva.
Vogais, consoantes,
ideogramas
e continua anônimo
o mundo.
Casamo-nos com aquilo
que em nós nomeia.
Ignoramos aquilo
que em nós sabe.
Cunhamos moedas,
colecionamos selos,
enlouquecemos Van Gogh,
matamos Rimbaud.
Extinguiu-se a vida
com os dinossauros.
Carregamos pedras
que ainda não se converteram
em roda.
Dos mortos guardamos
ouro e sobrenome.
O tempo se calcifica
nas veias extintas
dos fósseis.
Fragmentos devoram
o inteiro
nos Manuscritos do Mar Morto,
como se fosse, o mundo,
pálpebra a encobrir
o pasmo do olho.
Inventamos Shakespeare
como se Shakespeare não houvesse
nos inventado.
Talvez um dia possamos
escrever
com o mesmo zelo
dos suicidas
e a solicitude tão terna
dos incendiários
da Biblioteca de Alexandria.
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